tag:blogger.com,1999:blog-40960251324905379232024-03-13T16:19:45.541-03:00Alan AraguaiaBlog e sessão de descarrego individual.Alan Araguaiahttp://www.blogger.com/profile/10413482870143535729noreply@blogger.comBlogger28125tag:blogger.com,1999:blog-4096025132490537923.post-39753593850765419122012-05-23T11:54:00.000-03:002012-05-23T11:54:43.351-03:00De voltaHá um tempo não escrevia neste blog, não por falta de vontade. Algumas vezes abri a caixa de texto e comecei a digitar alguma coisa, mas uma impressão (ou intuição) persistente de banalidade quanto ao que via na tela, levava-me a bruscamente apagar tudo, revoltado com o fracasso em expressar o que carregava aqui dentro. Vergonha, culpa e superficialidade, para citar alguns dos sentimentos que me dominavam, eram os responsáveis pelo desgosto com minhas próprias palavras. Ainda pretendia dar voz a um personagem que já não mais existia, ou que pelo menos esforçava-me sinceramente para destruí-lo. Ele talvez possa ser descrito como um jovem afetado pela melancolia, e que, como Noel Rosa naquela canção, louvava a capacidade da filosofia em fazer-lhe viver indiferente. O apego a essa imagem, que tem um forte apelo estético, ao lado da consciência de como é fútil tal comportamento, faziam-me rejeitar as coisas que escrevia para alimentar o ego do personagem.<br />
<br />
De uns tempos para cá está se passando uma grande mudança em mim, a qual já posso sentir correndo em minhas veias. Tenho vontade de viver, e viver com alegria, compartilhando boas coisas com aqueles que me cercam. As correntes do ego adoecido ainda estão presentes, atraindo-me às suas tendências mórbidas: vaidade, egoísmo, sarcasmo, indiferença, etc. Mas sinto-me feliz em perceber que essas coisas estão cedendo lugar a novos valores, que hoje aprecio muito mais e dos quais quero me aproximar. O ego adoecido insiste em olhar com ceticismo para demonstrações de altruísmo, boa-vontade, afeto, bondade, entre outras virtudes, mas isso é reflexo da inveja por não ser capaz de experimentá-las. Hoje em dia (ou desde sempre?) vemos que a vaidade, o egoísmo, o sarcasmo e a indiferença gozam de um status privilegiado na sociedade, e é muito mais fácil ser aceito por ela se tiveres essas características, as quais, segundo seus valores deturpados, passaram a ser virtudes. E eu não quero mais contribuir com isso.Alan Araguaiahttp://www.blogger.com/profile/10413482870143535729noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4096025132490537923.post-41448522839248709952012-03-16T14:35:00.000-03:002012-03-16T14:35:38.017-03:00A dançaOs sons surdos dos tambores<br />
o tilintar dos sinos<br />
vozes dissonantes convidavam à dança<br />
o vinho não embriagava tanto<br />
senti que deixei meu corpo junto aos sapatos<br />
ali amarrotado como uma blusa tirada às pressas<br />
e eu era só alma bailando ainda que não soubesse<br />
meus movimentos foram tomados de uma graça repentina e surpreendente<br />
sem as limitações do corpo e os acanhamentos da mente tudo era possível<br />
no auge da libação, mão potente e implacável agarra-me pela nuca<br />
aferra-me ao corpo, à blusa e aos sapatos.Alan Araguaiahttp://www.blogger.com/profile/10413482870143535729noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4096025132490537923.post-64619226750949729682010-12-07T10:53:00.000-03:002010-12-07T10:53:27.874-03:00Sabe gente...Preciso aprender a só ser. Ouvi essa frase há bem mais de uma década, cantada por Gilberto Gil. Parece que é do Lupicínio Rodrigues. De qualquer forma, a identificação com essa constatação foi tão profunda que até hoje, volta e meia, eu me repito: preciso aprender a só ser. <br />
<br />
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<br />
<br />
que tiram liras da pedra<br />
<br />
Ou como os homens práticos<br />
<br />
Que tiram pedras da lira<br />
<br />
Ou ainda como o vulgo<br />
<br />
Que pisa sobre as pedras e as liras<br />
<br />
E não sente, pois<br />
<br />
Suas solas têm cascos<br />
<br />
<br />
<br />
Mas, o que sou?<br />
<br />
Nem poeta<br />
<br />
Nem prático<br />
<br />
Nem vulgo<br />
<br />
Só tenho o sentimento do mundo<br />
<br />
Embora não me chame Carlos nem Raimundo.Alan Araguaiahttp://www.blogger.com/profile/10413482870143535729noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-4096025132490537923.post-20851439183658202682010-09-12T09:18:00.000-03:002010-09-12T09:18:53.756-03:00Monólogo a dois- O que quiseste dizer com aquilo?<br />
<br />
- Aquilo o quê?<br />
<br />
- Aquilo que falaste.<br />
<br />
- Quando?<br />
<br />
- Vai dizer que não lembras?<br />
<br />
- Eu falo tanta coisa.<br />
<br />
- Mas aquilo foi absurdo!<br />
<br />
- Aquilo o quê?<br />
<br />
- Cara, tu és muito dissimulado mesmo. Não quero mais nem papo contigo. <i>(vira-se para ir embora)</i><br />
<br />
- Ei, espera aí!<br />
<br />
- Que foi?<br />
<br />
- Agora me conta. O que eu falei?<br />
<br />
- Se não sabes, eu que vou saber?<br />
<br />
- Acabaste de dizer.<br />
<br />
- E não lembras mais?<br />
<br />
- Não, acabaste de dizer que eu falei o que eu não sei.<br />
<br />
- Não, tu sabias muito bem. Estavas sóbrio.<br />
<br />
- Puta que pariu, é difícil conversar contigo, hein?Alan Araguaiahttp://www.blogger.com/profile/10413482870143535729noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4096025132490537923.post-46837933019132180362010-09-06T18:26:00.000-03:002010-09-06T18:26:39.332-03:00Possível história de Pimenta NevesOlhou no calendário e constatou: fazia três anos que não saía de casa, desde a morte da sua mulher, cujo principal suspeito era ele. Não podia conviver com os olhares inquisidores de todo mundo, certos de que ali estava um assassino repugnante, quando adentrava qualquer recinto ou caminhava nas ruas. Os comerciantes recusavam-se a atendê-lo, fechando as caras, e se insistisse poderia ouvir terríveis desaforos. As mulheres não correspondiam a seus olhares desejosos, fitavam-o com pavor, por isso incluíra em sua rotina uma ligação semanal para uma prostituta qualquer, sempre diferente. A maioria, indiferente aos noticiários, não reconhecia o psicopata que naquela época foi o grande filão sensacionalista, e que eventualmente reaparecia. Vivia dos rendimentos de uma poupança privada que, homem previdente, mantinha desde os vinte anos.<br />
<br />
De casa acompanhava o mundo com pouco interesse. Via TV, acessava a internet, ouvia rádio, vez ou outra falava ao telefone, quando a mãe ligava, e se desfazia em lamentações que o deprimiam mais ainda. Decidiu não atender mais. A conta de email não era acessada há muito, talvez tivesse sido desativada. Apenas recebia informações, o que de alguma forma o distraía. Sentia-se como um morto insepulto, a quem tivessem negado o direito do descanso eterno. Restos de crenças antigas se acumulavam no seu espírito, impedindo "acabar logo com tudo", palavras que emergiam na consciência, e que se esforçava em empurrar para qualquer outro lugar da mente.<br />
<br />
Acendeu mais um cigarro, recomeçou a fumar depois que "isso tudo" aconteceu. Abandonara o vício ainda jovem, esse e outros mais, mas o que pode fazer um semivelho confinado a uma casa escura e solitária?, perguntava irritado, como se algum intrometido o interpelasse. Fumava, esvaziava o bar que mantinha mais como um ícone burguês, masturbava-se compulsivamente e transava com mulheres perfeitas, autoesculpidas. Nos primeiros meses de reclusão tentara espiritualizar-se, com práticas meditativas e orações, mas acabou achando mais prático distrair-se através dos sentidos. <br />
<br />
Três anos. Pálido, inexpressivo, naquele dia vestiu o velho paletó e foi à rua, esquecido de si mesmo.Alan Araguaiahttp://www.blogger.com/profile/10413482870143535729noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-4096025132490537923.post-13621885037964703912010-05-21T16:34:00.000-03:002010-05-21T16:34:09.280-03:00O grande escritorTinham-no em conta de um grande escritor. Cinquenta anos de idade, desde muito cedo descobrira que se não escrevesse sua já frágil sanidade mental corria o risco de abandoná-lo definitivamente. Andava sempre com um bloco de papel, ou um pequeno caderno, e nele rabiscava suas impressões sobre o que via. Em grande parte, as anotações eram indecifráveis, seja pela caligrafia grotesca, deformada pelo tédio e pela ira, seja pela inegável originalidade das idéias. Tão originais que nem ele ali se reconhecia. Por esse motivo, não se incomodava se, de repente, alguém surpreendesse seus papéis e tentasse ler aquilo. Entre desenhos estranhos, como a lua que se curvava dando gargalhadas, e o homem composto de mãos, as palavras seguiam-se sem nada revelar.<br />
<br />
Até que certo rapaz, magro, alto, e com um olhar enfadonho, lançou-o sobre aquelas frases. "Isso é literatura moderna!", disse. "Tu desvirtuaste a prosa, resgatando sua perdida função poética através do intra-diálogo", completou. O rapaz tinha bons conhecimentos em uma editora, e pediu ao homem que reunisse algo. Como fosse desempregado, e além disso se atraísse pela glória, gostou da idéia. Sem qualquer critério, remexeu os velhos cadernos, e separou uns tantos que já formassem um volume. Intitulou: "Blasfêmias".<br />
<br />
E entregou ao rapaz moderno.Os editores, embora estranhassem aquele estilo, gostaram. Era uma obra fragmentária, segundo disseram. Em um mês, "Blasfêmias" estava nas livrarias de todo o país. Críticas em jornais, TV, convites para palestras em eventos diversos, logo o homem figurava no rol dos maiores intelectuais da nação. Alguns poucos olhavam-o com ceticismo, acusavam-o de oportunista, pseudo qualquer coisa. Só que ele já havia sido advertido que surgiriam tais reações, e sabia exatamente como se portar. Os jornalistas procuravam-o para saber o que tinha a dizer sobre a declaração do multiinstrumentista Fulano de Tal. Se fosse para televisão, inclinava a cabeça, sorria debochado e soltava coisas do tipo:<br />
<br />
- Quero que esse cara se foda. Ele já era.<br />
<br />
No dia seguinte, sua frase saía estampada nas revistas mensais e semanais, reverberava nos programas televisivos, ganhava os outdoors, e os admiradores do grande escritor só aumentavam. O multiinstrumentista, de ícone da cultura nacional, progressivamente tornava-se símbolo de nosso atraso. Ele, o poeta pós-concreto, a atriz cult e mais alguns ícones da cultura nacional, ao investir contra o laureado escritor, automaticamente eram relegados a símbolos de nosso atraso. Os demais logo perceberam essa regra, e, muito embora quisessem enxovalhar o polêmico escritor, disso se abstinham, em nome da própria sobrevivência. Em vez disso, eram orientados a enaltecê-lo. O dramaturgo de primeira, quando apareceu a oportunidade, asseverou:<br />
<br />
- Vivemos uma renovação no cenário socio-artístico nacional, e ele é o símbolo disso.<br />
<br />
E daí seguiam-se loas e mais loas ao cantado em verso e prosa escritor, e os anos foram passando, sem que alguém ousasse questionar o seu inquestionável valor. Casou-se trinta vezes com as mulheres mais desejadas da nação, e por diferentes razões. Enquanto isso, continuava a encher cadernos e mais cadernos com sua refinada literatura, no entanto, após "Blasfêmias" nada mais publicou. Também nada mais falou após repetir aquelas palavras para os cinco ex-ícones que ousaram enfrentá-lo. Aos cinquenta anos morreu de cirrose, e passados outros vinte começa a ganhar fôlego uma tendência acusando-o de ter sido uma grande farsa.Alan Araguaiahttp://www.blogger.com/profile/10413482870143535729noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4096025132490537923.post-63771705935792333332010-05-05T12:43:00.000-03:002010-05-05T12:43:27.748-03:00Sim, ShoppenhauerMúsica<br />
o mais perfeito dos comentários<br />
conexão direta com a alma<br />
sem atalhos<br />
perpassa-me com seus raios<br />
cada nota é uma orgásmica flechada<br />
ao final<br />
estou confortavelmente dilacerado<br />
e repouso, aliviado.Alan Araguaiahttp://www.blogger.com/profile/10413482870143535729noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4096025132490537923.post-9224483707147401092010-03-19T11:12:00.000-03:002010-03-19T11:12:05.764-03:00Pobres cidades ricasEm meio a discussão sobre a distribuição dos <i>royalties</i> do pré-sal, provocada por emenda do deputado Ibsen Pinheiro, o jornal de divulgação científica da Universidade Estadual de São Paulo (Unesp), levanta uma questão pouco lembrada: o que é feito com o dinheiro do petróleo nos municípios do Norte Fluminense, que recebem a maior parte dos royalties? A matéria mostra que a população continua a ver navios e plataformas petrolíferas de longe... leia <a href="http://www.unesp.br/aci/revista/ed05/pdf/UC_05_Royalties01.pdf">aqui</a>.Alan Araguaiahttp://www.blogger.com/profile/10413482870143535729noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-4096025132490537923.post-10392364487622036862010-03-10T10:59:00.000-03:002010-03-10T10:59:16.109-03:00O Velho - Chico BuarqueO velho sem conselhos<br />
De joelhos<br />
De partida<br />
Carrega com certeza<br />
Todo o peso<br />
Da sua vida<br />
Então eu lhe pergunto pelo amor<br />
A vida iteira, diz que se guardou<br />
Do carnaval, da brincadeira<br />
Que ele não brincou<br />
Me diga agora<br />
O que é que eu digo ao povo<br />
O que é que tem de novo<br />
Pra deixar<br />
Nada<br />
Só a caminhada<br />
Longa, pra nenhum lugar<br />
<br />
O velho de partida<br />
Deixa a vida<br />
Sem saudades<br />
Sem dívida, sem saldo<br />
Sem rival<br />
Ou amizade<br />
Então eu lhe pergunto pelo amor<br />
Ele me diz que sempre se escondeu<br />
Não se comprometeu<br />
Nem nunca se entregou<br />
E diga agora<br />
O que é que eu digo ao povo<br />
O que é que tem de novo<br />
Pra deixar<br />
Nada<br />
E eu vejo a triste estrada<br />
Onde um dia eu vou parar<br />
<br />
O velho vai-se agora<br />
Vai-se embora<br />
Sem bagagem<br />
Não sabe pra que veio<br />
Foi passeio<br />
Foi passagem<br />
Então eu lhe pergunto pelo amor<br />
Ele me é franco<br />
Mostra um verso manco<br />
De um caderno em branco<br />
Que já fechou<br />
Me diga agora<br />
O que é que eu digo ao povo<br />
O que é que tem de novo<br />
Pra deixar<br />
Não<br />
Foi tudo escrito em vão<br />
E eu lhe peço perdão<br />
Mas não vou lastimarAlan Araguaiahttp://www.blogger.com/profile/10413482870143535729noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-4096025132490537923.post-45896685619498752742010-03-02T13:18:00.000-03:002010-03-02T13:18:13.674-03:00Igreja Católica S/AA notícia não é da hora, mas segue o meu comentário: diz que D. Orani Tempesta, ex-arcebispo de Belém e atualmente na comarca do Rio de Janeiro, vai processar a Columbia Pictures por "uso indevido" da imagem do Cristo Redentor no filme "2012". Não vi o filme e nem pretendo, pois tudo indica que é um genérico dos outros filmes apocalípticos do diretor Roland Emmerich.<br />
<br />
Mas a disposição da Igreja Católica de processar o estúdio pode ser classificada de insana ou oportunista. Como assim, o Cristo Redentor é propriedade da Igreja? Não foi o Governo do Rio de Janeiro que construiu o monumento? Creio que o uso da imagem do principal cartão-postal do Brasil é livre, pois tornou-se um ícone da topografia mundial, largamente utilizado em uma série infinita de imagens. Imagina se a Igreja resolvesse pedir indenização de pintores, fotógrafos, designers e outros artistas que utilizam a imagem do Cristo?<br />
<br />
Fica evidente que a esperta Igreja Católica está mesmo é querendo faturar mais um pouco. Já até incorporou Cristo como sua propriedade privada...Alan Araguaiahttp://www.blogger.com/profile/10413482870143535729noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4096025132490537923.post-20500854444939484542010-02-26T11:41:00.000-03:002010-02-26T11:41:37.965-03:00Deus e EuAinda agora fiz uma oração. É algo que me faz sentir vergonha de mim mesmo, pois não gosto da idéia de acreditar em Deus - ou melhor, acreditar até que vá lá, mas precisar dele, é demais pra mim. Não tenho como negar que a serenidade que essa relação traz é mais agradável que o tumulto de estar entregue a mim mesmo, às minhas emoções confusas e indefinidas. Mas parece que esse bolo de angústia, apesar de incômodo, é aquilo que na verdade sou. E é difícil renunciar a mim mesmo, mesmo que a troca pareça atrativa.Alan Araguaiahttp://www.blogger.com/profile/10413482870143535729noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4096025132490537923.post-40808148721474387692010-02-23T12:16:00.000-03:002010-02-23T12:17:34.514-03:00Escrever, o número 3Falando ainda de J.D. Salinger, achei interessante a declaração atribuída a ele, explicando o seu aparente mutismo: "Gosto de escrever e asseguro a vocês que escrevo com regularidade. Mas escrevo para mim mesmo, por prazer. E quero ficar sozinho para escrever". Talvez um dia tenhamos acesso ao tanto que Salinger escreveu, e então saberemos se o escritor de fato merece figurar entre os grandes da literatura, ou se os escritos pós “O apanhador no campo de centeio” são medíocres. Mas isso é o que menos importaria para ele, caso estivesse vivo. Salinger deixa claro que a literatura para ele era uma atividade inerente à sua natureza, quase uma necessidade fisiológica. Podemos fazer essa comparação, pois tais como as outras necessidades dessa ordem, a literatura objetiva expelir as impurezas que do contrário iriam deteriorar o organismo do escritor.<br /><br />Eu escrevo todos os dias. Grande parte do que produzo – ou melhor, expilo – não tem a menor razão para ser publicado. São frases insensatas, incompletas, e também confissões feitas para o papel – e que em uma reflexão voltam para mim. De outra forma, não teria como me conhecer. E me conheço pouco. Há muito o que escrever. Cada qual tem a sua cota de necessidade.<br /><br />A imprensa noticiou a frase de Salinger como algo absurdo: como é que pode, o cara escreve e não edita? Que desperdício! Pensam que a literatura é um simples objeto cultural e mercadológico, que “precisa” ser vendida, “precisa” ser exposta aos outros. Hoje em dia vemos muitos livros nas revistarias, – estamos no tempo delas – e isso não é por acaso. Revistarias em geral vendem revistas, não livros. Mesmo quando essas revistas vêm travestidas de livros. Uma revista é um veículo de consumo rápido, trazendo um amontoado de informações e quase nenhum conhecimento. Assim são muitos dos “livros” que elas comercializam. Volumes fabricados oportunisticamente, de acordo com a onda do momento. Obama e Lula são os caras? Vamos lançar biografias e mais biografias deles, mesmo que suas vidas não pareçam estar perto do fim! Antigamente os biografados ou narravam sua própria história quando sentiam sua vida útil se esvair, ou eram resgatados pelos biógrafos após a sua morte – quando se poderia ter maior noção da importância histórica daquele indivíduo.<br /><br />Estou fugindo do assunto. Isso é normal, não faço de propósito. Conforme escrevo, as idéias aparecem, e vão ganhando contorno. Talvez um dia eu consiga começar um texto sabendo como ele vai terminar. Mas por ora minhas idéias estão um tanto embaralhadas, e escrevo justamente para organizá-las melhor. Então peço que não reparem na incoerência dessas palavras. O recinto está em obras.<br /><br />P.S.: genial esse título, hein? heheAlan Araguaiahttp://www.blogger.com/profile/10413482870143535729noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4096025132490537923.post-15583375888194629492010-02-22T10:28:00.000-03:002010-02-22T10:32:50.608-03:00Poetinha vagabundo<em>Comprovado: ouvir Vinicius de Moraes faz bem à sáude mental.</em><br /><br /><br /><object width="425" height="344"><param name="movie" value="http://www.youtube.com/v/nOfrdXsmXsA&hl=pt_BR&fs=1&"></param><param name="allowFullScreen" value="true"></param><param name="allowscriptaccess" value="always"></param><embed src="http://www.youtube.com/v/nOfrdXsmXsA&hl=pt_BR&fs=1&" type="application/x-shockwave-flash" allowscriptaccess="always" allowfullscreen="true" width="425" height="344"></embed></object><br /><br /><em>Como dizia o poeta</em><br /><br />Quem já passou por essa vida e não viveu<br />Pode ser mais, mas sabe menos do que eu<br />Porque a vida só se dá pra quem se deu<br />Pra quem amou, pra quem chorou, pra quem sofreu<br />Ah, quem nunca curtiu uma paixão nunca vai ter nada, não<br />Não há mal pior do que a descrença<br />Mesmo o amor que não compensa é melhor que a solidão<br />Abre os teus braços, meu irmão, deixa cair<br />Pra que somar se a gente pode dividir<br />Eu francamente já não quero nem saber<br />De quem não vai porque tem medo de sofrer<br />Ai de quem não rasga o coração, esse não vai ter perdão<br />Quem nunca curtiu uma paixão, nunca vai ter nada, nãoAlan Araguaiahttp://www.blogger.com/profile/10413482870143535729noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-4096025132490537923.post-46210497014065487382010-02-18T12:09:00.000-03:002010-02-18T12:10:53.026-03:00Trocando em miúdos, pode guardar...<object width="425" height="344"><param name="movie" value="http://www.youtube.com/v/hn4JyodL7K4&hl=pt_BR&fs=1&"></param><param name="allowFullScreen" value="true"></param><param name="allowscriptaccess" value="always"></param><embed src="http://www.youtube.com/v/hn4JyodL7K4&hl=pt_BR&fs=1&" type="application/x-shockwave-flash" allowscriptaccess="always" allowfullscreen="true" width="425" height="344"></embed></object>Alan Araguaiahttp://www.blogger.com/profile/10413482870143535729noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4096025132490537923.post-17341477721909819202010-02-10T13:57:00.000-03:002010-02-12T12:06:03.013-03:00Aos dezesseisAos dezesseis anos, Marta era uma moça destacada: olhar penetrante e que carregava uma espécie de raiva serena, de quem não sente o gosto amargo do próprio sentimento, mas com ele se delicia. Era linda e sabia disso: seios médios e bem firmes, pernas longas e grossas, uma bunda que torturava os meninos magrelos, espinhentos e tolos, quando a viam passar. Às outras meninas, que riam imbecilmente como eles próprios, tinham coragem de fazer "psiu", "oi, posso te conhecer?" e abordagens do gênero. Mas Marta impunha respeito. Seu olhar superior, o andar ereto, o rebolado indiferente, tudo isso intimidava aqueles garotos estúpidos. E punham-se a cochichar quando ela virava as costas. Como se sentissem humilhados, resolveram difundir pela escola que Marta era sapatão, história convenientemente acolhida pelas outras meninas, invejosas que estavam.<br /><br />Em pouco tempo os olhares para Marta já não traziam mais apenas despeito, desconfiança e desejo reprimido. Os alunos pareciam estar solidários e felizes uns pelos outros, porque podiam olhar Marta como um ser repugnante. Cochichavam entre si que a garota tinha um caso com a professora de História e gozavam de rir ao inventarem mais e mais histórias sobre ela. Só que Marta era mesmo melhor que eles. À raiva serena (é desprezo o nome disso?) juntava-se em seu semblante um sorrisinho irônico. O rebolar de sua bunda parecia mais provocante. A insegurança reinante entre aqueles adolescentes não os permitiu levar muito longe a encenação de superioridade. Marta era fantástica e não estava nem aí para eles, tiveram que admitir.<br /><br />Naquele colégio, nunca ninguém ouvira a voz de Marta, a não ser os professores, a quem procurava à parte, e falava de igual para igual com eles. Indignados, os alunos observavam-na debater em voz baixa com os professores, e como muitos deles curvavam-se às suas razões. Eles também sentiam-se incomodados com Marta. Quando conversavam na sala dos professores, ou em encontros fortuitos nos corredores, o assunto Marta sempre surgia. "Que garota impertinente", dizia o de Matemática. "Ela é ousada demais pro meu gosto", emendava o professor de Geografia, que nunca perdia uma oportunidade de gabar-se pela sua resistência aos anos de chumbo. Participara de duas ou três passeatas em 1966, depois disso não se sabe de nenhum ato subversivo seu.<br /><br />Reuniram-se com o diretor da escola para cobrar uma atitude dele quanto àquela menina que se portava de forma inadequada. Afinal, como pode uma garota argumentar com professores? Ainda mais com aquele olhar insolente! O diretor compreendeu as razões dos educadores, e assegurou que iria ter uma conversa com Marta. <br /><br />Na manhã seguinte, ao entrar na sala de aula um inspetor diz a Marta que o diretor deseja vê-la. Olhou fixamente para o homem, que tremeu os lábios e desviou o olhar. Mas não falou nada e seguiu em direção à diretoria. O diretor a esperava sentado em sua poltrona, com um ar tranquilo e um pouco sarcástico. Marta adentrou a sala com dignidade, sentou-se na cadeira à frente da mesa do diretor, e perguntou o que ele desejava, com um tom de voz cansado, mas muito digno.<br /><br />Diante daquela moça segura de si, educada e que não aparentava ser causadora de nenhum problema, o diretor arrependeu-se de tê-la trazido a si. "Não, para uma coisa serviu. Aqueles professores frustrados não vêm mais me incomodar, achando que dei um jeito nela", pensou. Mas ele teve uma idéia para resolver de vez a questão: sugerir à Marta que não deixasse transparecer demais a sua luz. <br /><br />"Isso será bom para a sua sociabilidade. O pessoal daqui não está preparado pra lidar com alguém como você", disse paternalmente. E completou ponderando que no futuro, quando fosse adulta, poderia agir como tal sem nenhum constrangimento. Marta pela primeira vez na sua vida não sabia o que responder. Ficou olhando o diretor longamente, mas em vez de seu olhar penetrá-lo, era visível que estava voltado para si mesma, em uma angústia terrível.Alan Araguaiahttp://www.blogger.com/profile/10413482870143535729noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4096025132490537923.post-27172440983128654542010-02-03T11:18:00.000-03:002010-02-03T11:44:52.977-03:00J.D. SalingerComo a maioria das pessoas, de J.D. Salinger só li "O apanhador no campo de centeio". Isso foi há quatro anos atrás, quando eu tinha 19 anos. Praticamente um pós-adolescente. Mas minha identificação com Holden Caulfield, o moleque de quinze anos que protagoniza a história, foi imediata. Minha idade emocional aos 19 era similar a de um cara de 15. <br /><br />Pensando bem, me identifiquei mais com o estilo narrativo de Salinger, corrido e aparentemente irrefletido. Acho interessante essa idéia de o escritor se deixar levar pela história (não sei se foi o caso de Salinger) em vez de começar o texto com um plano determinado. Lembro que quando li "Filosofia da composição", de Edgar Poe, pensei como era difícil ser escritor!<br /><br />A leitura de "O apanhador..." reacendeu em mim a vontade de escrever alguma coisa, de forma despretensiosa. Meu terrível senso auto-crítico acabou por sepultar minha carreira de escritor-mirim, mais ou menos com onze anos de idade. Ao ler Salinger, repensei: "caramba, até que escrever um livro legal não é tão difícil assim!" Essas reflexões estão surgindo agora, comecei esse post querendo falar de Salinger, mas não sabia bem o quê. Talvez sobre a sonoridade respeitável do seu nome, se é que isso existe, mas acho que é um nome digno de um escritor.<br /><br />Fiquei sabendo pelas notícias de sua morte que J.D. Salinger tornara-se um sujeito recluso há quase 50 anos. Não sabia nem que ele ainda estava vivo. Fiquei sabendo também que ele nasceu no dia 01/01, portanto era do signo de Capricórnio. Para muitos essa informação não quer dizer nada, ou quer dizer que quem liga pra essas coisas é um tapado. Mas isso me ajuda a entender a atitude (e o livro) de Salinger. Não vou explicar por quê, afinal esse não é um blog de Astrologia nem eu um grande entendedor do assunto.<br /><br />Vá em paz, Salinger. (frase só pra concluir esse texto, tô sem a mínina inspiração)Alan Araguaiahttp://www.blogger.com/profile/10413482870143535729noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-4096025132490537923.post-23269337439335090352010-01-20T11:52:00.000-03:002010-01-20T12:02:11.245-03:00Sinto-me imerso em uma confusão de idéias, desejos e atitudes que me levam a um estado de insatisfação. É como se minha mente fosse atravessada por um grande número de espíritos, que revezam entre si o controle sobre a minha vontade. Preciso retomar (será que um dia tive?) o controle do veículo, que, no final das contas, é meu. Não sei se posso debitar a culpa por esses tormentos a uma "legião estrangeira" ou se meu próprio espírito carece de unidade, tornando-se extremamente suscetível aos estímulos externos. O fato é que escrever sobre isso tem um efeito benéfico, que é o de abrandar essa inquietação, pelo menos momentaneamente.Alan Araguaiahttp://www.blogger.com/profile/10413482870143535729noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4096025132490537923.post-16229071595555972372009-11-24T16:36:00.000-03:002009-11-24T16:46:57.551-03:00Vegetarianismo: será que agora vai?Hoje decidi uma vez mais adotar a dieta vegetariana. Me sinto bem, uma sensação de paz e disposição. As pessoas viram vegetarianas por motivos diferentes: uns são defensores dos animais; outros tiveram algum trauma envolvendo carne (tenho uma prima que entra nesse caso, só que seu trauma foi específico com galinhas); outros, ainda, adotam a dieta por motivos de saúde, de forma voluntária ou por orientação médica. Eu me encaixo nesse terceiro grupo. A saúde que busco é primeiramente a mental, pois sou um cara meio pirado... e por experiência prática percebi que abrir mão da carne me faz muito bem! Entre o prazer de degustar um churrasco e ter paz de espírito fico com a segunda opção.<br /><br />Mas não é fácil... como disse o apóstolo Paulo "aquilo que quero, não faço; mas aquilo que não quero, esse faço".Alan Araguaiahttp://www.blogger.com/profile/10413482870143535729noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4096025132490537923.post-59036309982349354422009-11-19T12:48:00.000-03:002009-11-19T13:14:14.658-03:00Das profundezasUma matéria desmaterializada, segundo os físicos quânticos e místicos energia, alma, espírito, mente, consciência, centelha de luz... como és fugidia, escapas ao entendimento, no entanto és objeto e sujeito de minhas indagações. Tudo que faço é para te estimular, te ver sorrir e vibrar, só que tens uma lógica toda própria, desfalece-te na hora em que mais te quero em pé. Não posso dominar-te, pois és indomável, não és minha, eu que sou teu e preciso ser levado por ti, para onde mais queres, que me conduzas a esses reinos maravilhosos, que entrevejo em sonhos. Controlo minha respiração, procuro apagar da tela mental os sustos, as expectativas, as ferrugens, que são o que me ocultam de ti.<br /><br />Por milênios foste investigada, pois os antigos sabiam o teu grande valor. Toda ciência passava pelo teu filtro, os resíduos que ficavam eram reputados por tolices. Hoje os tolos reivindicam-se sábios, com seus esquemas, sistemas, dilemas e estratagemas que mais não são do que variações do mesmo tema, ou seja, a falta do que falar, a mera ginástica do raciocínio, que só serve para inflá-lo e enrijecê-lo.<br /><br />O conhecimento dos antigos volta a merecer a atenção dos arrogantes, que imaginavam terem inventado a ciência há 400 anos atrás. Vemos nas bancas de revistas multiplicarem-se textos e imagens que se refiram aos egípcios, gregos, judeus, indígenas, e outras tradições que observaram ao seu redor e olharam para dentro de si mesmos, percebendo que o que está fora identifica-se com o que está dentro, o que está em cima é igual ao que está em baixo. Um modo de pensar que buscava, em vez de aprofundar o problema da alienação humana, superá-lo ou ao menos amenizá-lo. Como deve ser bom dizer como São Francisco de Assis "bom dia irmão Sol, bom dia irmã Lua, bom dia irmão mosquito!"<br /><br />As dores conduzem ao crescimento. E a civilização contemporânea irá crescer, não sem antes sofrer, muito, as dores decorrentes de sua grande soberba. Após essa verdadeira "Idade das Trevas", que obviamente teve seus avanços, só que a maioria de autoria de seus desajustados, virá uma Nova Aurora, uma época em que a inteligência não será mais valorizada do que a sabedoria.Alan Araguaiahttp://www.blogger.com/profile/10413482870143535729noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4096025132490537923.post-39805762574692598682009-10-05T15:17:00.000-03:002009-10-05T15:18:55.087-03:00Rio 2016<object width="425" height="344"><param name="movie" value="http://www.youtube.com/v/ysA5fdUhs1w&color1=0xb1b1b1&color2=0xcfcfcf&hl=pt-br&feature=player_embedded&fs=1"></param><param name="allowFullScreen" value="true"></param><param name="allowScriptAccess" value="always"></param><embed src="http://www.youtube.com/v/ysA5fdUhs1w&color1=0xb1b1b1&color2=0xcfcfcf&hl=pt-br&feature=player_embedded&fs=1" type="application/x-shockwave-flash" allowfullscreen="true" allowScriptAccess="always" width="425" height="344"></embed></object>Alan Araguaiahttp://www.blogger.com/profile/10413482870143535729noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4096025132490537923.post-22889403132572053332009-09-29T10:38:00.000-03:002009-09-29T11:38:52.628-03:00O grande escritorTinham-no em conta de um grande escritor. Cinquenta anos de idade, desde muito cedo descobrira que se não escrevesse sua já frágil sanidade mental corria o risco de abandoná-lo definitivamente. Andava sempre com um bloco de papel, ou um pequeno caderno, e nele rabiscava suas impressões sobre o que via. Em grande parte, as anotações eram indecifráveis, seja pela caligrafia grotesca, deformada pelo tédio e pela ira, seja pela inegável originalidade das idéias. Tão originais que nem ele ali se reconhecia. Por esse motivo, não se incomodava se, de repente, alguém surpreendesse seus papéis e tentasse ler aquilo. Entre desenhos estranhos, como a lua que se curvava dando gargalhadas, e o homem composto de mãos, as palavras seguiam-se sem nada revelar.<br /><br />Até que certo rapaz, magro, alto, e com um olhar enfadonho, lançou-o sobre aquelas frases. "Isso é literatura moderna!", disse. "Tu desvirtuaste a prosa, resgatando sua perdida função poética através do intra-diálogo", completou. O rapaz tinha bons conhecimentos em uma editora, e pediu ao homem que reunisse algo. Como fosse desempregado, e além disso se atraísse pela glória, gostou da idéia. Sem qualquer critério, remexeu os velhos cadernos, e separou uns tantos que já formassem um volume. Intitulou: "Blasfêmias". E entregou ao rapaz moderno.<br /><br />Os editores, embora estranhassem aquele estilo, gostaram. Era uma obra fragmentária, segundo disseram. Em um mês, "Blasfêmias" estava nas livrarias de todo o país. Críticas em jornais, TV, convites para palestras em eventos diversos, logo o homem figurava no rol dos maiores intelectuais da nação. Alguns poucos olhavam-o com ceticismo, acusavam-o de oportunista, pseudo qualquer coisa. Só que ele já havia sido advertido que surgiriam tais reações, e sabia exatamente como se portar. Os jornalistas procuravam-o para saber o que tinha a dizer sobre a declaração do multiinstrumentista Fulano de Tal. Se fosse para televisão, inclinava a cabeça, sorria debochado e soltava coisas do tipo:<br /><br />- Quero que esse cara se foda. Ele já era.<br /><br />No dia seguinte, sua frase saía estampada nas revistas mensais e semanais, reverberava nos programas televisivos, ganhava os <em>outdoors</em>, e os admiradores do grande escritor só aumentavam. O multiinstrumentista, de ícone da cultura nacional, progressivamente tornava-se símbolo de nosso atraso. Ele, o poeta pós-concreto, a atriz cult e mais alguns ícones da cultura nacional, ao investir contra o laureado escritor, automaticamente eram relegados a símbolos de nosso atraso. Os demais logo perceberam essa regra, e, muito embora quisessem enxovalhar o polêmico escritor, disso se abstinham, em nome da própria sobrevivência. Em vez disso, eram orientados a enaltecê-lo. O dramaturgo de primeira, quando apareceu a oportunidade, asseverou:<br /><br />- Vivemos uma renovação no cenário socio-artístico nacional, e ele é o símbolo disso.<br /><br />E daí seguiam-se loas e mais loas ao cantado em verso e prosa escritor, e os anos foram passando, sem que alguém ousasse questionar o seu inquestionável valor. Casou-se trinta vezes com as mulheres mais desejadas da nação, e por diferentes razões. Enquanto isso, continuava a encher cadernos e mais cadernos com sua refinada literatura, no entanto, após "Blasfêmias" nada mais publicou. Também nada mais falou após repetir aquelas palavras para os cinco ex-ícones que ousaram enfrentá-lo. Aos cinquenta anos morreu de cirrose, e passados outros vinte começa a ganhar fôlego uma tendência acusando-o de ter sido uma grande farsa.Alan Araguaiahttp://www.blogger.com/profile/10413482870143535729noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4096025132490537923.post-50540133720586071852009-09-28T18:16:00.000-03:002009-09-28T18:22:34.267-03:00Uma pelejaFoi uma luta desigual. Ele, trêmulo, vacilante, instável e ofegante. O outro contínuo, inexplicavelmente sereno, pesado, constante. No entanto, como convém a pequenos, rejeitava o domínio do gigante. Gostaria que ele não existisse, que não estacasse ali, a impedir o seu progresso. Seu campo de visão apenas capturava o dedão do gigante, uma imagem grotesca, e desagradável em todos os sentidos.<br /><br /><em>(interrompido)</em>Alan Araguaiahttp://www.blogger.com/profile/10413482870143535729noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4096025132490537923.post-17444172952763442472009-08-27T17:47:00.000-03:002009-08-27T18:23:45.056-03:00Época de incertezasTemos visto muitos jornalistas brasileiros ainda lamentarem a decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) de anular a obrigatoriedade de diploma específico para o exercício da profissão. Sem entrar no mérito da decisão, este está longe de ser o maior dilema que a categoria (?) deveria se colocar, em tempos que a própria noção do que seja um jornalista está mudando radicalmente. O modelo de negócio jornalístico vigente no século XX, e que no começo deste apenas sobrevive, está realmente com os dias contados. Ainda não sabemos o que vem pela frente, mas variadas experiências pelo mundo afora dão uma idéia. Essas experiências têm em comum o individualismo, o associativismo, o colaborativismo, e modelos afins, em oposição ao corporativismo das grandes empresas de comunicação.<br /><br />Nesse sentido, é preciso refletir se o jornalismo resiste a essa nova realidade enquanto uma profissão, ou se caracterizará como uma atividade militante - não (apenas) no sentido partidário da palavra. Ou seja, se e como será possível viver do jornalismo. Nos Estados Unidos, cuja conjuntura econômica é um termômetro para o resto do mundo, dados recentes reforçam a preocupação: em 2008, os jornais americanos (ou estadunidenses, que seja) demitiram 15.974 pessoas e mais 10 mil na primeira metade de 2009. Vê-se que a continuarem nesse ritmo, haverá mais de 30% de aumento nas demissões. Esses e outros números são citados <a href="http://www.observatoriodaimprensa.com.br/artigos.asp?cod=552IMQ012">neste</a> artigo.<br /><br />Como não poderia deixar de ser, tudo converge para a internet. No ciberespaço pipocam blogs, sites independentes, listas de e-mails, redes sociais, e outras ferramentas que já se tornaram fonte preferencial de informação para muita gente, em especial aquelas pessoas chamadas de "formadoras de opinião". Como se observa em comentários e posts, as notícias veiculadas pelas grandes empresas são vistas com crescente desconfiança e até revolta. E com toda a razão.<br /><br />É cedo para dizer que a chamada grande imprensa vai desaparecer, dando lugar à hiperpolifonia da internet. Em especial no Brasil, e mais em especial ainda nessas paragens do norte, onde o poder político (que engloba o simbólico, o econômico, e todos os demais) das <a href="http://www.quintaemenda.blogspot.com/">"pocilgas"</a> ainda é vigoroso. Mas a sugestão que fica para todos nós, que optamos viver do jornalismo, é que procuremos nos posicionar o quanto antes nesse novo mundo, incerto e instigante.Alan Araguaiahttp://www.blogger.com/profile/10413482870143535729noreply@blogger.com0